quinta-feira, 31 de maio de 2012

Usuário

  Minha história não é diferente da de muitos outros, nem mesmo no que se refere ao seu começo. 
  Como todos os outros, comecei cedo e, infelizmente, o exemplo veio de casa. Isso mesmo, no meio da minha família, daqueles que deveriam me proteger e zelar por minha integridade física, moral e emocional. 
  Passei a adolescência e a juventude enfrentando a mesma dependência e, cada vez, me tornava mais escravo dessa droga. Procurei ajuda. Foi em vão.    
  A saída que me ofereceram era dispendiosa tanto para mim como para minha família. Por pouco tempo da minha vida adulta consegui me abster mas, com o decorrer do tempo, acabei cedendo novamente. 
  O que dizem é verdadeiro: “a volta é bem pior”. Fui tido como fraco, mas é fácil falar quando se está olhando de fora para dentro. Só quem está dentro sabe do que realmente estou falando. 
  Fiz longas viagens, em algumas delas até apaguei e, não fossem os companheiros que também fazem uso da mesma maldição, talvez nem voltasse. 
  Quando você é usuário, não importa a hora, o “bagulho” vai te pegar de jeito. 
  As manhãs eram os piores momentos do dia. Sentia minha cabeça fora do corpo, cada parte de mim gritava por socorro em meio às pressões e agressões que essa droga oferece. No entanto, cada vez mais, você precisa dela. Não importa se é dia ou noite, frio ou calor, sol ou chuva. 
  Conformei-me a ser um usuário no meio de tantos outros. 
  Já vi pessoas brigando, outras totalmente perdidas procurando por ajuda e muitas tentando sair por conta própria. Algumas se conformam e fazem uso até o final da vida, muito triste. 
  O governo faz vista grossa ao problema. As campanhas são paliativas e o investimento, pequeno, perto da demanda que o assunto merece. Tenho vergonha de chegar em casa após usar. 
  A sensação de que no próximo dia tudo aquilo me atormentará novamente é capaz de tirar o sono. 
  Tenho vergonha de falar quantas vezes uso para os amigos que não conhecem  e não entendem o se passa quando se está dentro dela. 
  Com muita vergonha confesso que sou usuário do transporte público. Utilizo os ônibus e metrô dessa cidade. 
  São Paulo cresceu, mas os meios de transporte não acompanharam ol crescimento, e acabaram por se tornar a droga desse infeliz e condenado usuário. 
  Como muitos outros usuários que também precisam viajar longas horas, enfrento a minha luta diária pensando que, algum dia, medidas melhores serão tomadas por parte dos responsáveis e, então, serei livre dos meus tormentos.           


                  Autoria do texto: Carlos Barabás

Um comentário:

  1. Olá pr. Carlos
    Parabéns pelo blog, que Deus continue abençoando sua vida, ótima mensagem. Fica na paz.

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